A Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC Brasil), realizada no fim de semana passado em Santa Catarina, exibiu tudo aquilo que se espera de uma versão tropical da cúpula da extrema direita global: ofensas a figuras da esquerda e a jornalistas, denúncias sobre a suposta perseguição judicial enfrentada pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro e defesa da liberdade de expressão para desacreditar o “sistema”. O mais relevante, contudo, é a confirmação da liderança inconteste de
Bolsonaro. Apesar da inelegibilidade,
Bolsonaro continua a ser a maior força política e, portanto, o maior cabo eleitoral dos extremistas da direita.
Aos bolsonaristas importa menos a condenação por irregularidades cometidas em 2022 e mais sua capacidade de mobilizar aliados e atrair eleitores. Como Lula da Silva em 2018 - à época preso pela Lava Jato e impedido de concorrer -, chega-se a apostar na candidatura de
Bolsonaro já em 2026, ainda que esteja proibido até 2030, como forma de puxar a corda em favor das hostes extremistas. Pelo que se viu na CPAC, essa extrema direita está preparada para fazer barulho, tentar gerar instabilidade institucional ou ganhar as eleições. Ou as três coisas somadas.
Reconhecida a musculatura política do ex-presidente, é o momento de separar o joio do trigo: há
Bolsonaro e o bolsonarismo, num lado, e há a direita democrática, no outro. São água e óleo. O bolsonarismo é a mais perfeita tradução de um extremismo destrutivo, só capaz de prosperar num ambiente de conflagração permanente e de negação dos padrões civilizados de convivência entre interesses sociais divergentes. A direita tradicional é democrática, sustenta-se nas ideias liberais e republicanas e sabe respeitar as instituições e as regras da democracia. Os extremistas bolsonaristas só querem delinquir sem serem incomodados. As reais forças de direita, porém, rejeitam o vale-tudo, a intolerância e o golpismo.
Não são apenas nuances, e sim visões radicalmente opostas sobre o exercício da política. Separá-las ajuda cidadãos e eleitores a escapar da armadilha fabricada pela esquerda. Para esta, sobretudo para o lulopetismo, “extrema direita” cumpre hoje o papel que a expressão “neoliberalismo” cumpria anos atrás, isto é, a possibilidade de rotular tudo o que a esquerda considera ruim - da austeridade fiscal à segurança pública, do conservadorismo nos costumes ao populismo de direita. Reconhecer tais diferenças é útil quando se observam
Bolsonaro e seu orgulho liberticida, que joga aos tubarões quem ousa ao mesmo tempo reivindicar o apoio dos seus devotos e respeitar instituições e adversários.
Eis aí a enorme missão a ser cumprida por outros nomes da direita brasileira, como os
governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e do
Paraná,
Ratinho Júnior (PSD) - os três principais candidatos a herdar o capital político de
Bolsonaro. É esse o desafio especialmente imposto ao
governador de São Paulo, o favorito: decidir se deseja apresentar-se como uma liderança da direita - democrática, liberal e republicana, insista-se - ou se quer se juntar aos delinquentes. É um dilema similar ao do Partido Republicano nos
Estados Unidos. Em tese, um partido existe para diluir ambições pessoais e valorizar causas. Hoje, os republicanos só têm uma causa: a que Donald Trump definir. O presidente do partido de
Bolsonaro, Valdemar Costa Neto, disse o mesmo sobre
Bolsonaro e o PL. Nada mais antidemocrático.
Se não quiser ser vista como parte do gangsterismo disfarçado de movimento político chamado “bolsonarismo”, a direita precisa negar
Bolsonaro. É uma equação eleitoralmente difícil, mas ou é isto ou então é mergulhar no abismo moral e político que o bolsonarismo representa. Para tanto, a direita democrática pode e deve galvanizar o espírito do antipetismo ou do desencanto de quem está farto dos rumos tomados pelo lulopetismo e sua promessa não cumprida de pacificar o Brasil. Mas, antes de mirar o PT, convém se descontaminar do que há de mais antidemocrático e incivilizado que este país produziu em sua história.
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